5 de setembro de 2018

RESENHA: ME CHAME PELO SEU NOME

Me Chame Pelo Seu Nome
Autor: 
André Aciman
Editora:
 Intrínseca
Páginas: 287
Resenha escrita por:
 Leonardo Santos

A casa onde Elio passa os verões é um verdadeiro paraíso na costa italiana, parada certa de amigos, vizinhos, artistas e intelectuais de todos os lugares. Filho de um importante professor universitário, o jovem está bastante acostumado à rotina de, a cada verão, hospedar por seis semanas na villa da família um novo escritor que, em troca da boa acolhida, ajuda seu pai com correspondências e papeladas. Uma cobiçada residência literária que já atraiu muitos nomes, mas nenhum deles como Oliver. Elio imediatamente, e sem perceber, se encanta pelo americano de vinte e quatro anos, espontâneo e atraente, que aproveita a temporada para trabalhar em seu manuscrito sobre Heráclito e, sobretudo, desfrutar do verão mediterrâneo. Da antipatia impaciente que parece atravessar o convívio inicial dos dois surge uma paixão que só aumenta à medida que o instável e desconhecido terreno que os separa vai sendo vencido. Uma experiência inesquecível, que os marcará para o resto da vida.

Elio já estava acostumado a rotina de ter visitas indesejadas durante os verões por conta de seu pai, um professor renomado que sempre apadrinhava jovens promissores os convidado para passar um tempo na casa de sua família para desenvolver teses e monografias. O motivo de Elio não gostar das visitas era justamente precisar ceder seu quarto para o hóspede durante as seis semanas, precisando assim se mudar para o quarto ao lado. Um novo verão se aproxima e com ele um novo hóspede. Oliver desde sua chegada causa um estranhamento a Elio, seja pelo seu jeito mais direto ou pelos ambiguidade que carregava em suas palavras e gestos, não demora muito para o garoto desenvolver uma faísca de desejo por Oliver e esse sentimento é explorado durante a narrativa de André Aciman. 


O livro é narrado em primeira pessoa por Elio, e desde o encontro dos dois é possível perceber conflitos na forma de como  o garoto vê a presença de Oliver. É interessante notar como a relação dos dois protagonista funciona, aqui vemos um jogo de olhares (que variam entre os de malícia, repreensão e até repulsa) e sentimentos (por muitas vezes é quase impossível dizer como Oliver se sente). Entretanto, o clima sexual vai crescendo conforme as páginas vão passando, e a manifestação do desejo de ambas as partes se tornam evidentes. Tudo isso cria um cenário muito instigante para quem está lendo. 
"É como a sensação de voltar para casa, como voltar para casa depois de anos entre troianos e lestrigões, como voltar para casa onde todos são como você, onde as pessoas sabem, simplesmente sabem… voltar para casa, como quando tudo se encaixa e de repente você percebe que passou quase duas décadas perdendo tempo com a combinação errada. Foi quando decidi expressar, sem me mover, sem mover um único músculo, que eu estaria disposto a ceder se você insistisse, que eu já tinha cedido, que já era seu, todo seu, mas de repente você não estava mais lá..."
No entanto, as engrenagens do jogo entre os protagonistas não são apenas sexuais, mas também intelectuais. Oliver fica impressionado com o conhecimento de Elio (que dá crédito ao pai por ter sempre instigado-o a ter contato com o mundo da filosofia e literatura) E Elio se atraí pelo modo de como o hóspede enxerga as coisas. Essa atribuição é muito boa porque deixa a trama mais complexa. As referencias a literatura italiana, grega e inglesa dão um tempero especial a trama, e isso dá certo por conta do histórico do autor. Aciman, além de escritor, é também um especialista em literatura e pesquisador. "Mente e corpo andam juntos, e antes de o corpo entrar em jogo, a mente já está alerta interpretando todos os sinais ao redor" Afirmou o autor para a Folha de S. Paulo. 

Uma das coisas que eu mais adorei no livro foi a ambientação do espaço. A forma como Aciman te leva para a costa da Itália é sensacional e extremamente sensorial. 
"O que eu mais amava eram as tardes: o cheiro de alecrim, o calor, os pássaros, as cigarras, o balanço das folhas das palmeiras, o silêncio que parecia um xale de linho leve sobre um dia absolutamente ensolarado, tudo isso realçado pela caminhada até a praia e a caminhada de volta para tomar uma ducha. Eu gostava de olhar para a nossa casa da quadra de tênis e ver as varandas vazias banhadas de sol, de saber que de qualquer uma delas dava para ver o oceano sem fim."
Um enfoque deve ser feito ao tema do livro, quando falamos de um romance LGBTQ logo pensamos naquele drama triste em que acaba com a morte de alguém ou então extrema repressão de toda a sociedade com o casal protagonista. Esses elementos PRECISAM ser retratados (devido a sua triste realidade), entretanto, não são a única forma de abordar uma relação. Me Chame Pelo Seu Nome foge disso com êxito, já que aqui o foco do autor é abordar as dores e expectativas do primeiro amor, da confusão de sentimentos e necessidade de saciar o desejo, uma nova onda literária vem fazendo isso, ampliando o leque de como as relações são desenvolvidas (como por exemplo o livro Love, Simon), isso é importante e precisa ser mantido. 
No geral a obra me agradou muito justamente por trazer boas reflexões sobre apreciar a vida que é nos dada. A última parte do livro talvez tenha sido a mais impactante para mim justamente por seus diálogos. Dando uma pesquisada sobre Heráclito, um dos filósofos mais tratados durante o livro, percebi o quão ligado o pensamento do filósofo condiz com a narrativa. De acordo com ele, tudo que existe está em transformação como em um fluxo sem fim e nos enganamos em olhar para as coisas com a ideia de que ela permanecerá a mesma seja daqui a uma hora ou daqui a mil anos. Oliver e Elio compartilhavam dessa filosofia, logo, aquelas seis semanas que eles passaram juntos jamais poderia ser reproduzida já que cada momento era único. Afinal, “É impossível entrar no mesmo rio duas vezes”. 
"No seu lugar, se houver dor, cuide dela, e se houver uma chama, não a apague, não seja bruto com ela. Arrancamos tanto de nós mesmos para nos curarmos das coisas mais rápido do que deveríamos, que declaramos falência antes mesmo dos trinta e temos menos a oferecer a cada vez que iniciamos algo com alguém novo. A abstinência pode ser uma coisa terrível quando não nos deixa dormir à noite, e ver que as pessoas nos esqueceram antes do que gostaríamos de ser esquecidos não é uma sensação melhor. Mas não sentir nada para não sentir alguma coisa… que desperdício!" 

PS: Muitas vezes Elio descreve sua paixão por Oliver de forma extremamente idealizada, nos fazendo lembrar das características do Romantismo. 

PS2: A descrição de Elio pode ser considerada explícita demais, entretanto o autor defende o uso da linguagem.

PS3: Também há divergências sobre a diferença de idade entre os personagens, enquanto Elio tem 17 e Oliver tem 24. Sobre isso, o autor se pronunciou sobre "Não penso a respeito, é Elio, o adolescente, que insiste na consumação da relação, e não o contrário. Odeio leituras morais sobre a literatura".

18 comentários:

  1. Que interessante, o livro narra o desenvolvimento do primeiro amor de Elio e ainda nos brinda com referências à grandes filósofos. Todo o clima literário e o pano de fundo na Itália soam muito atraentes. Reparei ainda que os nomes dos protagonistas têm relação com a natureza: Elio significa "sol" e Oliver "oliveira" (talvez uma referência ao verão na costa italiana).

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    1. Que incrível, Patrícia! Não conhecia essa referência.
      Obrigado por complementar ainda mais a resenha.
      Abraço!

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  2. Eu já ouvi muitas críticas sobre esse livro, até mesmo sobre o filme.
    Ainda não li e nem assisti, não tenho opinião própria.
    Mas quero conferir, sem dúvidas.

    Abraços,
    Naty
    http://www.revelandosentimentos.com.br

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  3. Achei bem legal o conteudo do livro, tanto a historia principal como as referencias filosóficas do plano de fundo

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  4. Já ouvi falar muito neste livro, mas ainda não tinha lido nada sobre ele. Adorei sua resenha e é claro, já está na minha lista de livros para ler junto com um montão de outros aqui.
    Ps: Seu blog é lindo! <3

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  5. Achei muito interessante este livro , gosto muito deste género de literatura , uma excelente sugestão

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  6. Olá! Já ouvi tanto falar desse livro que estou bem tentada. Gostei de saber que não se trata de puro drama ou puro romance, mas de, na medida do possível, um romance real. Histórias assim são boas. As referências à literatura devem mesmo dar um toque todo especial, e essa capacidade de transportar por meio de palavras é maravilhosa

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    1. O livro é muito real no que podemos esperar de um primeiro relacionamento. Vale muito a pena dar uma lida.

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  7. Esse livro é tão amorzinho, mas tão amorzinho né? amo ele fortemente, ele também teve um papel super importante na minha aceitação, em me entender, tenho esse livro como um dos queridinhos da estante.

    Parabéns pelo post maravilhoso!!

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    1. Sim, ele retrata bem isso mesmo, a exploração do desejo e tudo mais. É incrível o quanto um livro pode nos ajudar em diversos momentos <3

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  8. Esse livro é tão singular, a história na verdade é tão necessária, e mais que uma questão de representatividade, é uma história de amor, a gente tem 897485484 livros com héteros e pouquíssimas obras realmente incríveis para o público LGBT, eu amo esse livro, e amo o filme, na verdade, me chame pelo seu nome tá concorrendo a melhor filme do ano pra mim. haha

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    1. Exatamente, precisamos de livros como esse que exploram o amor de todas as formas <3

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  9. Parabéns pela resenha e pelo blog, eu ainda não li o livro, vou procurar para ler, obrigado por me seguir, faço parte do Projeto Seguidores para o Blog, estou te seguindo, beijinhosssssssssssss

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Leonardo Santos



Olá leitories! Meu nome é Leonardo Santos, tenho 28 anos, sou de São Paulo mas atualmente estou em Guarulhos cursando Letras! Minha paixão pela leitura começou desde muito cedo, e é um prazer compartilhar minhas leituras e experiência com vocês!

Equipe do Porão

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