Juarez passou anos distante da própria família. Não porque quisesse, mas porque foi afastado — por julgamentos, por olhares enviesados, por silêncios que, ao invés de proteger, machucam. Tudo começou com a forma como enxergaram sua relação com Laurinha, a irmã mais nova. Comentários mal interpretados, gestos que ganharam outras intenções. E, quando percebeu, Juarez já não cabia mais naquela casa.
O tempo seguiu, e foi só com a morte do pai que ele retornou. Não havia festa, nem reconciliação esperada. Apenas o luto e o vazio deixado por anos de ausência. A casa que um dia foi lar agora abrigava mágoas velhas, ressentimentos não ditos e uma família que, aos poucos, foi se desmontando. Laurinha, antes tão próxima, agora é outra. Reage com raiva, guarda nos olhos a dureza de quem se sentiu traída, mesmo sem nunca ter entendido o que, de fato, aconteceu.
Entre tudo isso, Juarez se vê atraído por Diana — que, por ironia ou crueldade do destino, é namorada de seu irmão. Esse sentimento, que surge quando ele menos espera, bagunça ainda mais o terreno já instável em que pisa. Mas é também através dessa relação que ele encontra força para revisitar o passado e lidar com as dores que ficaram.
Enquanto tenta se reconectar com os irmãos e entender o que sobrou da família que deixou para trás, Juarez se vê cercado por temas que o atravessam: o peso das palavras mal ditas, os efeitos de uma educação autoritária, as marcas do luto e a importância de enxergar além da superfície das coisas.
Apesar de trazer um fio de romance, Ala Saudade não se apoia nele. O que move a narrativa é o impulso de revisitar o que ficou pra trás, reorganizar lembranças e buscar os pontos onde tudo começou a desandar. Renata Feltrin conduz Juarez por caminhos difíceis, sem suavizar as dores que eles precisam enfrentar — e nós também somos arrastados por esse processo. A força do livro está exatamente aí: na forma direta com que lida com temas densos como saúde mental, espiritualidade, luto e culpa, sem recorrer a atalhos ou caminhos fáceis.
Um aspecto que se destaca é a maneira como a autora revela os efeitos de uma criação marcada pela rigidez e pela brutalidade, principalmente do pai de Juarez, violento; e de sua mãe, permissiva. Laurinha também ocupa grande parte da narrativa, e tem trechos dela que apertam o coração de qualquer um que for ler.
Nisso, Juarez encontra um refúgio nos poemas que escreve, em seu trabalho para o jornal da cidade e também em seus próprios sonhos e devaneios, que é onde encontra aqueles que saíram de sua vida tão cedo — e é aí que a história ganha um charme ainda maior.
Quando a leitura se encerra, a sensação que fica é de que o título carrega um peso da melancolia e do luto, mas com uma chance de juntar as peças e tentar uma redenção em um retorno: não apenas físico, mas emocional e íntimo. A volta de alguém que precisa reorganizar os próprios afetos em meio a uma casa que já não é mais a mesma, e que talvez nunca tenha sido.