Um dos meus primeiros contatos com os personagens da mitologia greco-romana foi com "Metamorfoses", de Ovídio. É incrível poder reler esse épico poético que nos transporta para o cerne de um mundo tão expansivo e tão complexo como o do mundo antigo. A coletânea, composta por quinze livros, retratam as transformações que todos esses personagens acabam passando em um momento ou outro em suas histórias, dispostas em versos de forma lírica.
Além da comovente história de Orfeu e Eurídice, "Metamorfoses" nos presenteia com outros contos que simplesmente estão entre os meus favoritos da vida. No Livro I, Ovídio introduz o mito da criação, narrando o nascimento do universo a partir do caos primordial, estabelecendo a fundação para as histórias subsequentes. A habilidade de Ovídio em personificar forças cósmicas e transformá-las em narrativas vívidas é evidente desde o início.
No Livro II, a lenda de Feton ilustra o preço da arrogância e da ousadia ao buscar guiar a carruagem do sol de seu pai, Hélio. Ovídio descreve poeticamente o destino trágico de Feton, mergulhando nas águas do rio Erídano após ser atingido por um raio de Zeus:
"Assim ele falou; mas Júpiter não pôde romper
o juramento que fizera ao Styx, a jurar pelo Styx é irrevogável,
mas deu um sinal por meio de seu raio, e seu raio envolto em nuvens
atingiu o condutor e o jogou para baixo do alto céu."
No Livro III, a narrativa de Narciso e Eco destaca a vaidade e a tragédia resultante da busca incessante pela autoimagem perfeita. Ovídio captura a ironia poética da história, culminando no momento em que Narciso, obcecado por sua própria imagem refletida na água, desvanecesse em uma flor:
"Ele se estendeu sobre a erva que o amava e, ao estender-se, ela fugiu.
Ele quis dizer 'Adeus' e sua própria voz o surpreendeu.
Levou a mão aos cabelos, que não eram cabelos para ele,
nem foi possível tocar o corpo que tanto desejava."
Cada livro de "Metamorfoses" evoca uma espécie de imersão nas complexidades do mito, revelando não apenas a transformação física, mas também a metamorfose emocional e psicológica que os personagens enfrentam. Do mito de Ícaro e Dédalo, passando pela história de Píramo e Tisbe até a transformação de Aracne em uma aranha, Ovídio tece uma tapeçaria de histórias que exploram temas como amor, paixão, traição, orgulho e redenção.
A narrativa de "Metamorfoses" é conduzida por uma prosa poética que foi responsável por atravessar séculos de história e se permanecer importante até hoje. Ovídio confere vida às divindades e mortais, criando uma obra imortal que ressoa com as inquietações e anseios humanos — e talvez seja por isso que eu goste muito dessas histórias.