Olá pessoal do Porão Literário! Hoje vou compartilhar com vocês uma entrevista feita com Rafael Figueiredo, autor de "Escravos das Memórias"
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1. Sua obra toca em temas delicados, como o luto, a identidade e os relacionamentos abusivos. O que o inspirou a abordar essas questões em seu livro de estreia?
Esses temas são inspirados na minha própria vivência. Coloquei muito da minha carga pessoal no protagonista, mas deixei que ele resolvesse suas questões de acordo com sua própria mentalidade e maturidade. Para mim, como autor, foi um processo terapêutico, porque, mesmo criando o Guilherme, aprendi muito com ele.
2. O bullying que Guilherme sofre durante a infância e a adolescência tem um impacto profundo em sua trajetória. Como você trabalhou a questão do bullying no livro e o que espera que os leitores reflitam ao ler essas passagens?
O bullying que o Gui sofre é tão real quanto o que acontece na vida real. Inicialmente, não planejava colocar detalhes tão gráficos, mas achei necessário, pois sei que muitos pais ou futuros pais poderiam ler. Uma das missões do meu livro é conscientizar. Para isso, às vezes é preciso mostrar o que acontece em muitas escolas até hoje. O Guilherme é um garoto que, mesmo sem ter estereótipos óbvios de alguém que seria alvo de bullying, ainda assim sofre. O bullying é uma cultura enraizada em muitas escolas, onde a administração muitas vezes não dá a devida atenção. E, infelizmente, a vítima muitas vezes tem medo ou vergonha de contar aos pais, com receio de piorar a situação ou por pura vergonha.
3. A história apresenta uma dinâmica de poder e conflito entre Guilherme e seu meio-irmão, Victor. O que você quis explorar nessa relação familiar conturbada?
Victor representa, na história, a personificação de uma família tóxica, mas ao mesmo tempo é quase tudo o que sobrou para o Guilherme. No início, ele precisa decidir o que fazer com essa relação, enquanto, para Victor, já é claro que Guilherme é apenas um fardo herdado do pai e do avô. O Guilherme, por outro lado, ainda vê no meio-irmão uma esperança de conexão com a única família adotiva direta que lhe resta. Curiosamente, mesmo após descobrir outro irmão por parte de mãe, Miguel, na adolescência, Gui ainda tem uma obsessão em conquistar o amor e respeito de Victor. Isso reflete muito a vivência de alguns filhos adotivos em lares que não são tão acolhedores, gerando uma insegurança que nunca vai embora.
4. A dependência de medicamentos que Guilherme desenvolve é um tema central na trama. O que o levou a inserir essa questão e como ela dialoga com os outros temas do livro, como luto e vingança?
A dependência de medicamentos é um dos maiores infortúnios do personagem na trama principal. Guilherme descobre que, com os remédios, ele pode se desligar da empatia, o que lhe traz uma falsa sensação de conforto. Ele se torna mais egocêntrico e narcisista, o que lhe dá alívio de não sentir culpa ou remorso, embora isso seja um grande erro, e lhe ajuda a criar até mesmo um alterego. Guilherme sempre se culpa por tudo, algo que foi reforçado por Victor e Marley, como se sua vida estivesse cercada de tragédias, desde a morte de seus pais. Gui é um personagem trágico do começo ao fim.
5. "Escravo das Memórias" traz uma reflexão sobre os limites entre justiça e vingança. Como você vê essa dualidade no livro e na vida real?
Acredito que todos nós desejamos justiça, mas, às vezes, a imaturidade nos leva a confundir as coisas. Guilherme decide se vingar depois de seu acidente quase fatal, e não vê outra forma de seguir sua vida. Para ele, a vingança é a única forma de justiça, já que passou a vida inteira sendo injustiçado. Ele deixou de acreditar que existe uma justiça que não seja feita pelas próprias mãos, e, com isso, busca o poder que seu próprio irmão alcançou para vingar-se das pessoas que ele culpa por ter perdido sua inocência. Curiosamente, uma dessas pessoas o faz mudar de ideia, levando-o a questionar: vingança e justiça estão no mesmo patamar? E é aí que começa o grande dilema de Guilherme.
6. Quais são seus projetos literários para o futuro?
Pretendo continuar criando histórias que tragam mensagens de vida, usando exemplos reais. Nesta primeira obra, foquei na dependência de remédios, especialmente o zolpidem, com o qual eu mesmo tive uma dependência por alguns anos e que trouxe muitos problemas à minha vida e minhas relações. Passei por várias das situações que o Guilherme passa, e a mensagem do livro é que a vida pode ser cheia de problemas, mas sempre devemos pedir ajuda a quem confiamos. Estou pensando em novos projetos. Escravo das Memórias é uma obra que se fecha em si mesma, então dificilmente imagino uma continuação direta. No entanto, quero criar outras histórias inspiradas nas lutas de pessoas que admiro, que foram ainda mais formidáveis que eu em momentos em que a vida as testou.